sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Submissão eterna

Já não me recordava da última vez que conseguira descansar bem e sem interrupções. Desde algum tempo antes, não houve uma noite em que eu não tivesse pesadelos, daqueles que nos fazem acordar a meio da madrugada com suores frios e o coração a bater desenfreado no peito. 
Todas as noites o pesadelo começava da mesma forma: com uma ida a um cemitério. Eu deslocava-me até lá como um autómato, sem controlo sobre as minhas acções, e era atraído até um mausoléu decrépito, cuja porta se abria à minha chegada, convidando-me a entrar. Eu entrava e, logo a seguir, a porta fechava-se, selando-me dentro daquele túmulo. Havia um caixão lá dentro, que se abria e do qual saía uma mulher de cabelo negro e roxo, que então me olhava nos olhos e me fazia perder por completo a pouca força de vontade que ainda me restava. E, a partir daí, o que acontecia variava: ou ela me mordia no pescoço, banqueteando-se com o meu sangue, ou me mordia na garganta, quase me arrancando a traqueia, ou então fazia-me deitar ao lado da bancada onde o seu caixão estava e, com um cutelo, começava a desmembrar-me, espalhando sangue por toda a parte. E, sempre que eu acordava, parecia-me que o meu quarto estava envolvido por uma névoa esquisita. Todavia, sempre julguei que fosse uma ilusão de óptica causada pela falta das lentes de contacto.

 
Aquela falta de descanso estava a dar cabo de mim, e isso reflectia-se no meu trabalho. O meu índice de produtividade começou a decrescer e comecei a falhar tarefas simples, tudo porque, de vez em quando, começava a cabecear devido à falta de descanso. Às vezes, era acordado por um grito do meu supervisor; outras vezes era o aparecimento dos olhos amarelos dos meus pesadelos que me faziam dar um salto na cadeira. Para ajudar mais à festa, para além da falta de descanso, eu passava todos os dias com uma fraqueza enorme. Não tinha falta de apetite – aliás, eu conseguia comer quase o suficiente para um regimento – mas, por mais que eu comesse, parecia que, no dia seguinte, tinha passado um dia inteiro sem comer. Fui ao médico e falei-lhe de todos os meus problemas, mas ele limitou-se a receitar-me calmantes e soporíferos e disse-me que precisava de descansar. Escusado será dizer que os medicamentos não funcionaram. Inevitavelmente, semanas mais tarde, acabei por meter baixa, pois o meu grau de exaustão e cansaço era demasiado.
Naquela noite, acordei às 3h34, a gritar, depois de ter sonhado que aquela mulher me havia sangrado para dentro de uma bacia, como se faz aos porcos nas matanças da minha terra – isto depois de me ter partido os braços e as pernas com a maior das facilidades. Arregalei os olhos tentando ver onde me encontrava, e constatei que estava realmente na minha cama e no meu quarto. E, por cima de mim, a pairar, estava aquela espécie de névoa; corri para a secretária e coloquei febrilmente os óculos, tentando deslindar aquele mistério. Todavia, quando voltei a olhar para cima, estava tudo normal.
- Foda-se! – gritei – Mas eu estarei a endoidecer?!
Comecei a vestir-me, com umas calças de ganga e um blusão de cabedal por cima da t-shirt desbotada que estava pendurada na guarda da cama, calcei os ténis e saí porta fora.
Saí de casa sem rumo: sentia-me ainda mais enervado que o costume, a roçar o desespero. Eu queria dormir, queria descansar. E não sabia o que fazer. Fui andando sem destino certo, mesmo sabendo que as ruas, à noite, são perigosas.
Não sei se foi uma coisa propositada ou obra do acaso, mas acabei por dar por mim nas imediações do cemitério da freguesia. A mim, os cemitérios nunca meteram grande medo, sendo aliás locais de me fascinavam de certo modo. Nunca experimentara, todavia, permanecer em um durante a noite. Mas, naquela noite, eu queria fazê-lo. Queria encontrar o mausoléu dos meus pesadelos, vê-lo e constatar que não tinha nada de anormal – apesar de não fazer a mais pálida ideia sobre se aquele túmulo estaria efectivamente naquele cemitério…
Saltei o muro – havia um monte de terra duro encostado a um dos muros – e dei por mim no lado ocidental do cemitério. O espaço era grande, dividido em talhões e quase todos eles tinham mausoléus. Puxei do telemóvel, abri uma aplicação para ligar uma lanterna e fui andando, tentando não tropeçar.
À medida que ia procurando o edifício sepulcral dos meus pesadelos, fui constatanto como, à noite, um cemitério é um lugar assustador. Talvez uma grande parte disso seja mental, mas vê-se sombras criadas pela luz, ouvem-se os insectos noctívagos, ou a brisa a fazer restolhar as flores ou tremer as poucas velinhas que ainda se mantêm acesas, e acho que qualquer pessoa ficaria com os nervos à flor da pele.
E os meus nervos ficaram piores ainda quando me meti num corredor de mausoléus e tive uma sensação de déjà vu; e, logo a seguir, cheguei a um deles que reconheci imediatamente. Era ali! Era aquele! Tinha uma forma paralepípeda, com uns cinco metros de altura por dois de largura e quatro de comprimento, e uma porta de ferro com vidros foscos, não deixando ver nada lá para dentro. Só que… dava para se perceber que havia uma luz lá dentro, uma vela ou algo similar. Aquilo não fazia sentido. Olhei em busca de identificação e vi uma plaquinha metálica a dizer "Jazigo de Jacinto Rafael e família". E, do lado esquerdo, uma foto do senhor Jacinto, com os seus dados de nascimento e morte. Ao que parece, só estaria lá dentro um defunto.
Engoli em seco. Tinha encontrado o jazigo que tanto me apoquentara nas semanas anteriores, e estava iluminado. Por parvoíce minha, coloquei a mão na maçaneta da porta e rodei – e dei um pulo para trás quando me apercebi que a porta não estava trancada! Fiquei cerca de cinco minutos parado à porta, sem saber que fazer. Então, lembrei-me do que eu estava a passar, das minhas crises de sono e fraqueza. Acabei por colocar a mão na maçaneta e abrir a porta lentamente.
Esperava deparar-me com um cheiro horrendo ou um cenário dantesco, mas nada disso ali existia. O mausoléu tinha umas três prateleiras à esquerda e duas à direita; e em todas elas existiam velas acesas. Na prateleira do meio, do lado direito, estava lá um caixão. Todavia, todo o interior do túmulo demonstrava um abandono evidente, com o mármore das prateleiras a estar coberto por algo verde – musgo? – e não existir qualquer espécie de flor, coroa ou indício de alguém ter estado ali a prestar a sua homenagem ao falecido nos tempos anteriores. O que não fazia sentido, tendo em conta as velas… e outra coisa que não fazia sentido é que, olhando melhor para cima do caixão, para o local onde a prateleira de cima deveria estar, notavam-se indícios de ela ter ali estado efectivamente, mas haver sido retirada entretanto.
Subitamente, ouvi um estrondo por trás de mim: dei um pulo e virei-me para trás, deixando cair o telemóvel, mas havia sido apenas a porta do mausoléu a fechar-se. Respirando fundo, aliviado por ter sido apenas isso, fui até à porta e abri-a… ou tentei. Quando tentei rodar o manípulo da porta, ela não se mexia! Engoli em seco e senti um arrepio percorrer-me a espinha, enquanto eu tentava, com todas as forças que tinha, abrir a porta. Empurrei, rodei aquela maçaneta, dei pontapés à porta e tentei arrombá-la com o ombro – tudo sem efeito. Comecei a entrar em pânico com a perspectiva de ter de passar o resto da noite dentro daquele mausoléu com um caixão, mas não via mais nenhuma possibilidade – de manhã, ia desatar aos berros até que um dos funcionários me ouvisse e me tirasse dali. Respirei fundo e tentei acalmar-me: não valia a pena ficar enervado, afinal de contas não havia nada que eu pudesse fazer para remediar aquela situação. Apenas me restava esperar.
O meu olhar caiu então sobre o caixão. Era de madeira – mogno, talvez – e tinha pegas prateadas. Confesso que nunca percebi muito bem porque se gasta tanto dinheiro em algo que é para ir para debaixo da terra e ser roído pelos bichos – o que não era verdade neste caso, vá, mas não existe grande diferença nos caixões, sejamos sinceros. A minha mente começou então a tentar perceber porque me tinham os meus pesadelos atraído até àquele local, onde eu agora estava encarcerado. Será que o pior estava ainda para vir? Será que o fantasma do senhor Jacinto Rafael me ia assombrar por eu estar ali a perturbá-lo? Mas, se fosse assim, porque sonhara sempre eu com uma mulher, se ali estava sepultado um homem? De qualquer forma, a minha situação não podia piorar mais do que até então. Fui para a ponta do caixão do lado da porta e tentei erguê-la com as mãos: o peso que senti indicava, obviamente, que o mesmo estava ocupado – nenhuma surpresa aí. Depois, hesitei sobre se haveria de o tentar abrir. Para além da falta de respeito para com o defunto, o caixão deveria estar selado e chumbado, por forma a não deixar passar para o exterior o cheiro a decomposição. Mesmo assim, achava que podia tentar. O que tinha a perder? As hipóteses de estar aberto eram ínfimas, assim acabava com a curiosidade e podia começar a desesperar pela madrugada e pela abertura do cemitério.
Todavia, o caixão estava aberto.
Assim que senti que a tampa se estava a abrir, o meu coração acelerou imediatamente. Hesitei, pensando sobre se deveria concluir o meu acto ou voltar a fechar o caixão – mas a curiosidade era demasiada, mesmo. Acabei por abrir a tampa por completo. E o que estava lá dentro surpreendeu-me.
Apesar de estar dentro de um mausoléu em que, em teoria, um homem estaria lá sepultado, dentro do caixão repousava uma mulher. O seu longo cabelo estava pintado de duas cores – franja preta e restante cabelo roxo – os seus lábios carnudos eram encarnadíssimos e os seus olhos estavam maquilhados como se tivesse acabado de se pintar, e o seu rosto ostentava uma expressão pacífica. Ela estava vestida de preto, com uma camisa de seda de manga comprida abotoada até ao pescoço, um corpete com molas metálicas à frente e luvas de cabedal. Vestia calças de cabedal e calçava botas de salto alto do mesmo material, pelo meio da perna e com atilhos de alto a baixo. Todavia, apesar de ela ser muito bonita e estar vestida de uma forma que se pode considerar excitante, eu senti-me empalidecer, enquanto os meus olhos se fixavam no seu rosto. Era ela! A mulher que havia tomado os meus sonhos de assalto, transformando-os em pesadelos hediondos! Era ela que, noite após noite, me magoava, me mordia, me desmembrava! E eu havia-a encontrado deitada num caixão, dentro de um mausoléu fechado – tal como nos meus pesadelos! Pela décima vez naquela noite, senti-me a hiperventilar e a entrar em pânico. Voltei a atirar-me à porta, tentando febrilmente abri-la, atirando-me a ela como se a minha vida dependesse disso (e talvez dependesse!), mas mais uma vez sem sucesso. Virei-me, encostei as costas à porta e deixei-me escorregar para o chão, com a cara escondida pelas mãos. Nada daquilo fazia sentido.
Um restolhar fez-me levantar a cabeça. Fiquei totalmente sem reacção ao constatar que o corpo que estava deitado no caixão já não estava deitado: havia acabado de se sentar! As suas pálpebras estavam ainda fechadas, o seu rosto estava ainda imóvel, mas a parte superior do seu corpo havia-se erguido. Então os seus olhos abriram-se, arregalando-se, e as suas pupilas amarelas fitaram-me, como se me quisesse penetrar dentro da minha mente. Era exactamente o olhar que, nos meus pesadelos, me deixava totalmente à sua mercê! E… era o que estava a acontecer! Estava a tentar mexer-me, tentar erguer-me, afastar-me dela, mas o meu corpo não me obedecia! Entretanto, a mulher havia saído de dentro do caixão e estava agora sentada na prateleira, com as pernas a balançar e as mãos agarradas à borda da plataforma de mármore. A sua boca estava agora contorcida num sorriso sádico.
- Olá, olá, Meu querido. É bom ver-te em Minha casa. – disse ela. Os seus olhos não deixavam de estar fixos em mim, da mesma forma que os meus estavam presos nela – Já era altura de nos conhecermos como deve ser, depois de tanto tempo.
Não percebi o que estava ela a querer dizer. Eu nunca a tinha visto antes! Ou… estaria ela a referir-se aos pesadelos? Mas isso era impossível!
- És mais bonito que o que Eu Me havia apercebido. – continuou ela.
O seu pé direito poisou no meu ombro esquerdo, e senti o seu tacão enterrar-se na minha carne. Quis gritar de dor, mas a minha boca não me obedeceu.
- Diz-Me uma coisa, jeitoso: que achas de Me limpares as botas?
Não pude responder nada: virei automaticamente a cara na direcção daquela bota e beijei o seu cabedal e a sua biqueira, começando a lambê-la como se fosse um gelado. Todo eu lutava contra o instinto de obedecer àquela mulher estranha, mas era como se o meu corpo e a minha mente fossem duas entidades diferentes e sem qualquer ligação uma com a outra, pois eu fazia exactamente o oposto do que desejava fazer. Lambi-lhe a bota desde as solas, os tacões e o cano; de seguida, ela trocou as pernas e encostou-me o seu outro pé no outro ombro, que eu lambi com a mesma sofreguidão. 
- Sim, senhora, estás a ser um rapazinho bastante obediente. Gosto disso em vocês. – disse ela, assim que eu acabei o meu trabalho de língua. Logo de seguida ela saltou para o chão, sempre olhando para baixo, sempre olhando para mim, para os meus olhos – Levanta-te e despe-te. Todinho.
Ergui-me, como um autómato, e tirei o blusão e os sapatos, despi a t-shirt, as calças, as meias e os boxers, ficando integralmente nu à sua frente. Ela começou a circular à minha volta, o melhor que pôde (afinal de contas, estávamos num espaço algo exíguo!), aparentemente inspeccionando-me. Senti a sua mão apalpar-me as nádegas, passar-me os dedos pela barriga e acariciar-me a pila e os tomates. Ela aproximou a cara do meu pescoço e pareceu-me que ela me cheirava.
- Hmm, estás a precisar de fazer exercício, Meu caro. Talvez com o tempo tratemos disso… agora, põe-te de quatro no chão.
Em dois movimentos automáticos, fiquei na pose que ela desejava. Não sabia o que se estava a passar comigo, como era possível que ela conseguisse ter um controlo tão grande sobre mim? Pareceu-me vê-la tirar algo de dentro do caixão, algo comprido e fino. Subitamente, senti algo a morder-me nas nádegas – levei algum tempo até perceber que o que se tinha passado foi que ela me tinha dado uma vergastada com o que tinha na mão!
- Agora vamos ver como é o Meu controlo sobre ti. 
Passou-me a ponta daquela vara pelas costas, como se  estivesse a fazer desenhos com ela, antes se levar mais uma pancada, desta feita na zona das omoplatas. Doía como o raio, aquilo… só que, mais uma vez, a minha boca não se abriu. Aquela rotina continuou por mais alguns instantes, os desenhos seguidos das vergastadas, alternando entre as minhas costas e nádegas, até que se decidiu pelo meu traseiro. Depois, ela começou a dar-me pancadas, sem dar tempo de descansar ou de me preparar, e todas elas com força. Dava ideia que ela queria levar-me ao limite…
Quando ela parou, colocou-me a vara entre as minhas nádegas magoadas, deixando-a ali ficar alguns instantes; depois, retirou-ma e ficou com ela na mão.
- Muito bem, Meu querido. Agora quero-te de joelhos, virado para Mim.
Assim que obedeci, ela voltou a sentar-se na prateleira, colocando-me os pés nos ombros novamente – e espetando-me os saltos mais uma vez. Os seus olhos voltaram a pregar-se em mim.
- Agora, vais tirar-Me as botas e massajar-Me os pés. E, depois, uns beijinhos… estar todos os dias com elas calçadas, mesmo estando a repousar no Meu caixão, sempre os magoa um bocadinho. Ao trabalho, Meu drone!
Antes que eu pudesse pensar em fazer alguma coisa, as minhas mãos já tratavam de se aproximar do laço que apertava os atacadores da sua bota direita e desatavam-no, tratando, de seguida, de lha retirar, pousando-a delicadamente no chão. Fiz o mesmo à bota do seu outro pé e os seus pés ficaram poisados em cima dos meus ombros, Peguei no seu pé esquerdo, colocando-o entre as minhas mãos, e comecei a passar os polegares pela sua planta do pé, à medida que ia beijando a ponta de cada um dos seus dedos de unhas encarnadas. Enquanto as minhas mãos massajavam a planta dos pés, fui metendo, um por um, os seus dedos na boca e fui-os chupando e lambendo, ouvindo aquela mulher a ronronar de prazer. Ocasionalmente, fui sentindo a sua vara ser-me poisada em cima da cabeça. De seguida, apoiei aquele pé no ombro e passei a cuidar o seu pé direito, fazendo a mesma coisa: massajando, beijando, lambendo e chupando. Então, ela tirou-me os pés de cima dos ombros e aproximou-mos do baixo-ventre, começando a pisar-me os órgãos genitais com força. Enquanto isso, ia soltando uma gargalhadinha trocista.
- Não mexe, Meu querido! Não vacila! Nem sequer abras a boquinha para gritar! Os Meus súbditos aguentam tudo o que lhes faço… caso contrário, arranco-lhes a garganta.
Ela não estava a ser nada meiga comigo: as dores que sentia na pila e nos tomates, normalmente far-me-iam gritar a plenos pulmões, para além de os meus joelhos já implorarem por descanso. Todavia, por mais que eu tivesse de verbalizar toda a dor que sentia, não conseguia fazer nada, nem sequer abrir a boca! Diria que estava prisioneiro dentro do meu próprio corpo. Ela divertia-se a espezinhar os meus genitais e não havia nada que eu pudesse fazer para parar aquilo!
Misericordiosamente, os seus pés lá deixaram de me esmagar as minhas partes baixas, acabando por mos colocar em cima dos ombros mais uma vez.
- Altura de Me voltares a calçar as botas, Meu menino. – disse ela, com alguma alegria na voz – E nada de Me deixares o resguardo enrolado, ou alguma coisa desalinhada… Quero as minhas botas perfeitamente calçadas. E se fizeres um trabalho inadequado, vou-Me alimentar das tuas entranhas. Contigo vivo.
Automaticamente peguei na bota do seu pé direito com uma mão e alarguei-lhe os atacadores, por forma a que a perna e o pé pudessem passar sem problemas; enquanto agarrava na parte do pé da bota, a minha outra mão tentava alisar-lhe e apertar-lhe as calças, tentando que nada ficasse enrolado ali. Depois de uma luta algo complicada, lá consegui com que a bota ficasse no seu lugar, faltando ajeitar-lhe o resguardo e apertá-la – para além da outra bota, claro está. Fui puxando os atacadores, atilho a atilho, de forma a que não houvesse qualquer folga nos cordéis e que o cabedal da bota ficasse justo em redor da perna daquela “mulher”.
Quando acabei de atar o laço que prendia os atacadores daquela bota, tinha uma dor na cabeça dos dedos do esforço para puxar aquele fio fino. Todavia, mais uma vez, o meu corpo não ligou a isso, optando antes por repetir o que acabara de fazer, desta feita com a outra bota. Diria que demorei mais algum tempo com aquela, pois a meio tive de tirar o pé novamente por causa do resguardo. Mas, eventualmente, lá consegui acabar aquela bota também. Assim que o fiz, ela saltou novamente para o chão.
- Nada mau, Meu querido, nada mau. Talvez te mantenha. – declarou ela, agarrando-me no cabelo e puxando.
Não percebia nada daquilo. Manter-me onde? Como? E como conseguia ela ter um controlo sobre o meu corpo daquela forma, sem que eu pudesse reagir ou mexer-me de outra forma sem ser para lhe obedecer? E, principalmente… quem era ela e o que estava ali a fazer?
- Levanta-te.
Assim que o fiz, ela pousou a cabeça no meu ombro e envolveu-me nos seus braços, com o meu nariz a captar um aroma bastante ténue a decomposição. Então senti uma mordiscadela no ombro, delicada, seguida de uma lambidela na mesma zona. Ergueu a cabeça e vi-a sorrir, vendo-lhe os dentes pela primeira vez… e os caninos sobredesenvolvidos.
- Todas as noites, desde há uns meses para cá, tenho-Me alimentado de ti, da tua força e do teu sangue, sem que tu dês por isso. Mas hoje é uma noite importante. Hoje, passas a ser totalmente Meu. – e, dito isto, apertou-me nos seus braços e mordeu-me com toda a força no pescoço.
Naquele momento, e pela primeira vez desde que ela havia olhado para mim, consegui ganhar algum controlo sobre as minhas acções: pude abrir a boca e gritar de dor, estrebuchando para me tentar libertar do seu abraço; todavia, ela era demasiado forte. As suas mãos agarravam-me na cabeça, forçando-me a ficar na mesma posição enquanto a sua boca se mantinha agarrada ao meu pescoço, sobre a ferida que os seus dentes me fizeram. Ela parecia um animal, grunhindo, rosnando e resfolegando à medida que a sua boca se ia enchendo com o meu sangue. Comecei a sentir-me enfraquecer, a sentir dificuldades em manter-me acordado…
Quando voltei a mim, estava deitado sobre o colo daquela criatura, com a cabeça apertada contra o seu peito. Levantei os olhos e assustei-me com o seu rosto, com o sangue – o meu sangue – que lhe encharcava a boca e escorria pelo queixo, sujando-lhe as roupas. Ela havia aberto a camisa manchada, mostrando os seus seios cobertos por um soutien de renda. A sua mão baixou-o logo de seguida – ela tinha retirado a luva, exibindo umas unhas compridíssimas, quase em jeito de garras, pintadas metade de preto e outra de vermelho cor-de-sangue, enquanto a outra me acariciava a face. Então, uma das suas unhas fez uma ferida no seu peito, abrindo uma veia e deixando o sangue escorrer livremente, sujando-nos ainda mais. A minha cabeça foi então segura por forma à minha boca ficar encostada à ferida; estrebuchei e tentei libertar-me, mas a força com que ela me estava a segurar era demasiada para mim.
- Bebe. – ouvi-a comandar-me.
Mesmo que eu não quisesse, tive de obedecer, pois, caso não ingerisse o seu sangue, havia enormes probabilidades de morrer sufocado. Assim que comecei a beber aquilo, tive uma vontade incontrolável de vomitar… mas o meu corpo estava novamente sob o seu feitiço.
- Bebe, Meu submisso. Bebe à tua saúde. Bebe à tua imortalidade. Viverás a tua vida e obedecerás aos Meus chamamentos, bastará Eu dizer-te “vem!” e tu virás, não importa a distância que nos separe. E, quando finalmente morreres e te tornares não-morto, serás Meu súbdito até ao final dos tempos. Por isso bebe, não pares… és Meu para sempre.
Não conseguia acreditar no que estava a ouvir. Aquilo era irreal! Impossível! Mas, enquanto ela me tirava a boca do seu peito e me afastava de si, deixando-me cair no chão, apercebia-me que tudo aquilo era irreal, inexplicável… mas havia acontecido. E, se dúvidas houvesse, a dor que sentia no pescoço e o sabor revoltante de sangue que sentia na boca comprovavam que tudo aquilo não havia sido mais um pesadelo. Ao tomar consciência da realidade da situação, desatei num pranto.
- Agora, veste-te e sai. – disse ela, insensível ao meu choro – Vou dar uma volta, tratar de assuntos Meus, e não te quero ver aqui quando regressar. Mas continuarei a visitar-te nos próximos dias, para manter o Meu menino controlado… e para te ajudar a chegares à não-morte mais rapidamente. Até amanhã, Meu brinquedo.
Ouvi os tacões das suas botas no chão do mausoléu enquanto ela se dirigia na direcção da porta e a abria com a maior das facilidades. Logo a seguir, desapareceu, enquanto eu continuava deitado no chão, a soluçar convulsivamente, sentindo-me aprisionado num cárcere invisível.

(história seguinte)

1 comentário:

  1. Hum diferente, mas gostei. Como faço para te marcar tambem?? Mordo também? ou dá-me ideias... Beijinhos

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