segunda-feira, 8 de setembro de 2025

Jogos de reconciliação (parte 2)

 


continuação...

Olhei para os monitores que tinha à minha frente e sorri. Tudo corria consoante tinha planeado: tinha os quatro prisioneiros lado a lado (apesar de não se conseguirem ver) e a serem penetrados ao ritmo das pulsações uns dos outros. Vi que Paulo e Belinha estavam acelerados: imaginei que a minha patroa estivesse irritada por se ver metida numa situação em que estava dependente do marido e, por isso, a sua pulsação estivesse acelerada. Quanto ao outro par, Helena e a minha sósia/irmã Ana, estavam mais lentas: o facto de não haver uma ligação afectiva tão forte talvez resultasse numa velocidade tão acelerada. Sabia que não podia esperar muito tempo, pois algum deles podia carregar no botão e ver que aquilo da “electrocussão fatal” era tanga: foquei a câmara de Paulo e, assim que o vi fazer força com o braço esquerdo, carreguei num botão da consola que tinha a frente e que imediatamente desapertou a correia que lhe prendia o pulso. Reparei imediatamente que a sua pulsação aumentou (como seria de esperar, quando notas que te conseguiste libertar de uma prisão) e que, por conseguinte, os dildos de Belinha aceleraram imenso. Mas Paulo já estava a libertar o outro pulso, a arrancar os fios que tinha presos ao corpo e que o podiam “matar”, finalmente arrastando-se para longe do alcance dos dildos que continuavam em movimento. De súbito, vi que se acendeu uma luz na consola: Belinha havia carregado no botão de electrocussão… felizmente Paulo já se havia libertado.

Eles estavam deitado em cima de quatro estrados, com restrições que não lhes permitissem que se conseguissem ver uns aos outros. Paulo levantou-se e viu que Belinha estava ao seu lado; naturalmente o seu primeiro instinto foi correr para ela e libertá-la das suas amarras. Sorri pelo instinto protector dele: talvez não estivesse tudo perdido…

De súbito, senti que alguém me estava a mexer no que quer que fosse que me estava a prender os pulsos, libertando-mos e tirando-me para fora do alcance da fucking machine, como o nosso captor lhe tinha chamado… Ergui a cabeça  e pude ver que se tratava de Paulo, que ele de qualquer maneira se tinha conseguido libertar e não havia hesitado em libertar-me… felizmente ele havia-se libertado antes de eu não ter aguentado mais e ter carregado no botão, caso contrário ele não estaria ali para me libertar! Vi que ele estava agora ocupado a tentar libertar Helena e Andreia e notei que Andreia tinha uma coleira especial à volta do pescoço, de metal, com um aparelho qualquer na parte da frente. Apalpei o meu pescoço e senti uma coleira semelhante: Paulo e Helena não o tinham. Escusado será dizer que estávamos os quatro nus.

- Ena, ena, ena, os meninos conseguiram soltar-se! Muito bem! Se ao menos o jogo tivesse acabado… mas receio que apenas tenha começado.

Olhámos em volta, todos a tentar ver o que nos rodeava; para além daquela espécie de estrados onde havíamos estado presos e dos ecrãs onde podíamos ver o nosso parceiro, nada mais se via, apenas câmaras de filmar. Nem sequer se via o vislumbre de uma porta. Subitamente, ouviu-se um estalido e, no meio de uma parede que parecia sólida havia aparecido uma porta como que por magia.

- Por este lado está a vossa salvação… ou a vossa perdição! Obviamente se ficarem quietos no mesmo sítio, o jogo termina… e as vidas acabam. As vossas.

Sem hesitar, Paulo pegou-me na mão e guiou-me para a porta aberta, enquanto Andreia fazia o mesmo à pobre Helena, que permanecia cega. Assim que passámos a porta, ela fechou-se atrás de nós. Estávamos agora num corredor fracamente iluminado por lâmpadas de fraca luminosidade. Então, as coleiras que eu e Andreia tínhamos ao pescoço soltaram um apito prolongado.

- A partir do momento que a porta se fechou, iniciou-se uma contagem decrescente. – continuou a mesma voz – Vocês têm trinta minutos… bem, agora menos que isso… para encontrarem a saída do meu labirinto. Se, quando a contagem decrescente terminar, ainda não tiverem dado com a saída, há duas meninas muito marotas que vão ser estranguladas e morrer com falta de ar. Mas, se já estiverem no exterior quando acabar esse prazo, oh, alegria, a vossa coleira soltar-se-á como que por magia. Portanto… neste momento têm menos de 29 minutos para salvarem as vossas caras-metades. Boa sorte! – e terminou com uma gargalhada estridente, que ecoou pelos corredores.

Paulo voltou a pegar-me na mão.

- Por aqui, vamos! Não temos tempo a perder! – declarou ele, mas eu fiquei quieta.

- Calma aí, filho da puta. Agradeço-te teres-me salvo há bocado, mas não preciso da tua ajuda.

- Belinha, se achas que vou ficar quieto enquanto um maluco qualquer te mata, estás enganada. Vamos embora, por favor! O tempo é pouco e não sabemos o que nos espera!

- Ele tem razão, Belinha. Temos de nos despachar. – continuou Andreia, sempre agarrando Helena que, coitada, tentava enxergar alguma coisa olhando para todos os lados.

- OK, OK. Queres liderar, então? – aquiesci, olhando para o meu marido.

Ele tomou a liderança do nosso grupo e eu fui atrás, tentando ajudar Andreia com Helena.

 

O caminho era estreito, tinha poucas lâmpadas, muito espaçadas entre si, e de fraca luminosidade. O solo era muito irregular, escavado na rocha, e por diversas vezes senti as arestas vivas a cortarem-me os pés. Paulo ia à frente, tentando encontrar a saída daquele emaranhado de corredores e túneis; por diversas vezes ele quisera agarrar-me na mão para me fazer andar mais depressa, mas eu sacudia-o sempre. Não me sentia preparada para o sentir agarrar-me novamente… apesar de eu estar livre e com possibilidades a sobreviver àquela estúpida aventura graças a ele. Será que eu estava preparada para o aceitar novamente se eu deixasse de lhe cobrar a sua traição? OK, eu também me havia enrolado com homens quando fora a despedida de solteira de Helena1, mas era diferente, porque… porque…

De súbito parámos. À nossa frente estava uma parede, mas havia saídas para a direita e para a esquerda. Ambas idênticas, ambas sem qualquer indicação sobre o que estaria mais adiante.

- E agora? – interrogou Andreia, sempre a abraçar Helena. Era horroroso olhar para a hermafrodita com os seus olhos brancos como leite…

- Não tenho ideia nenhuma. – comentou Paulo – Mas não queria que nos dividíssemos…

Foi interrompido por uma voz, ensurdecedora, que parecia vir de todos os lados e de nenhum lado ao mesmo tempo:

- Devo-vos lembrar que têm, neste momento, quatro minutos para salvarem as vossas caras-metade. E para vos dar mais um incentivo para se porem a mexer, os túneis vão ser inundados de gás metano, que, como vocês bem sabem, não vos faz muito bem à saúde… tic tac, tic tac!

Entreolhámo-nos aterrorizados: menos de quatro minutos para encontrarmos a saída, e ainda por cima gás metano a encher os túneis!

- Temos de escolher um lado! – berrou Paulo, entrelaçando a mão dele na minha… e não a retirei.

- Mas qual? Fazemos um-dó-li-tá? – comentei, olhando para cada um dos túneis, à espera que, por magia, algo se acendesse e assinalasse o caminho certo.

- Ou então dividimo-nos… – sugeriu Andreia, com pouca vontade.

- Não nos devíamos dividir. – afirmei, peremptoriamente.

- Assim alguém se safa, e se encontrarem a saída, gritam para os outros, pode ser que dê tempo! – comentou Paulo, também a olhar para os túneis.

- É um tiro no escuro… – gemeu Helena.

- Pode ser. Mas é a nossa única chance. – e, de forma resoluta, Paulo avançou pela o túnel da esquerda, sempre a agarrar-me na mão; quando olhei para trás, Andreia e Helena estavam a virar-se para tomarem o outro túnel.

Estávamos numa derivação ligeiramente mais estreita que o corredor de onde havíamos saído, e era frequente eu ou Paulo estarmo-nos sempre a magoar nas arestas vivas que estavam nas paredes, pois a abertura mal dava para nós passarmos – e ainda por cima em passo acelerado, visto o tempo que faltava até a coleira que eu tinha ao pescoço me matar provavelmente estar mesmo quase no limite… Subitamente deparámo-nos com uma porta de correr, metálica e de aspecto pesado cheia de ferrugem, com uma pega no meio.

- Bravo, casal número um, encontraram a saída! – ouviu-se novamente a voz – Agora… será que conseguirão escapar-se antes do meu gás metano vos apanhar? Será que Paulo conseguirá abrir a porta antes da minha coleira matar a sua cara-metade? Ainda bem que tenho pipocas para assistir a estes últimos segundos!

Sem dizer palavra, Paulo atirou-se à porta de forma desenfreada, procurando uma maneira de a conseguir abrir, sem grande sucesso.

- Paulo, deixa, não te importes… – declarei, cansada e atirando-me para o chão – Obviamente que o filho da puta que orquestrou tudo isto não nos vai abrir a porta…

- O caralho é que vou! – rugiu o meu marido, sempre a batalhar com a porta – Se pensas que vou ficar a assistir enquanto morres electrocutada, estás muitíssimo enganada!

Então, deslizando-a para o lado, ela pareceu avançar para dentro da parede alguns centímetros, voltando ao lugar inicial logo a seguir. Com os olhos marejados de lágrimas, agarrei-o pelo braço.

- Eu… eu estou conformada. Sei que vou morrer hoje, agradeço-te o esforço… mas depois disto tudo, não vamos ter salvação, o tipo que engendrou isto não…

- Cala-te e ajuda-me! – interrompeu-me Paulo com impaciência – Se puxarmos os dois para este lado, devemos conseguir!

Paulo continuou os seus esforços e, realmente, parecia que a porta se estava a abrir milimetricamente! Mesmo com pouca energia, agarrei-me à pega, ao mesmo local onde o meu marido fazia força enquanto gritava por Andreia e por Helena, para que viessem ter connosco, que a saída era por ali. Assim que a abertura se tornou larga o suficiente, Paulo agarrou-me e praticamente atirou-me pelo buraco, seguindo-se ele depois.

O exterior da porta estava fracamente iluminado por uma luz esbranquiçada; demorei algum tempo para perceber que aquela “luz” era a luz da Lua. Tínhamos conseguido escapar daquele maldito complexo! Todavia, ainda havia um problema, pois apesar do que nos havia sido dito, eu duvidava que os poderes eléctricos daquela coleira desaparecessem ao passarmos pela porta de saída… mas nem foi preciso dizer nada, uma vez que Paulo imediatamente se agarrou à coleira que eu tinha ao pescoço; com meia-dúzia de puxões conseguiu retirar-ma e atirá-la ao chão, momento em que uma onda eléctrica a percorreu. Tinha sido mesmo na altura certa! Olhei para Paulo, que havia caído redondo no chão, extenuado pelos esforços que havia feito para me salvar – a mim, à sua mulher, à gaja que o repudiou por causa de um caso e que estava seriamente a pensar deixá-lo para sempre. OK, ele havia-me traído, mas eu também fizera o mesmo, especialmente desde a cilada que Andreia lhe armara… Os meus olhos humedeceram-se de lágrimas.

- Paulo… obrigado. – murmurei, tentando controlar-me. Muito obrigado por tudo o que fizeste por mim lá dentro. Não tinhas que o fazer, especialmente da maneira que te tenho tratado  desde… bom, desde a altura que tu sabes.

- Farias o mesmo por mim, Isabela, eu sei disso. – declarou ele, agarrando-me nas mãos e fazendo-me encará-lo – Porque eu sei que tu me amas. Quase tanto como eu te amo. Por isso, claro que faria tudo para te salvar. Eu morreria por ti, querida.

E beijámo-nos. Não sei quem tomou a iniciativa e, muito sinceramente, nem interessa: o que interessa é que nos beijámos. E que senti que o muro que erguera entre mim e ele se havia esboroado como um castelo de areia quando uma onda o atinge. Um muro de ódio destruído por uma onda de amor. E eu chorei. Chorei por aquele momento, que nunca dantes julgava poder voltar a sentir, por sentir o mesmo amor que sentia por Paulo e que me havia levado a casar com ele e a ter o Duarte com ele…

Fomos arrebatados do nosso momento idílico pelas vozes de Andreia e de Helena. Andreia arrastava Helena, que ia aos encontrões contra a parede nua e cheia de rugas e vincos…

- Só mais uns metros, querida! – gritou Andreia.

Porém, quando nada o fazia prever, a porte metálica fechou-se, deixando as duas fechadas lá dentro.

- Não! – gritei, horrorizada, tentando novamente abrir a porta; mas, mesmo com ajuda de Paulo, daquela vez foi impossível mover aquela barreira ferrugenta um milímetro que fosse. Do outro lado, ouvíamos gritos de dor. Bati com os punhos na porta, chorando mas desta vez de raiva: não era justo o que aquele filho da puta havia feito, não era justo que Andreia e Helena morressem assim, ali, a meros centímetros de mim, sem que eu pudesse fazer nada…

Paulo abraçou-me com força, procurando mitigar a minha dor, a minha perda. Andreia era mais que uma simples empregada dos meus ateliers de cabeleireiro: era uma amiga, uma colega de aventuras; e perdê-la daquela maneira, por um motivo tão fútil, por um simples desígnio de uma mente maligna e perversa que as matara apenas porque sim…

Chorei durante minutos. De súbito, a porta metálica e ferrugenta deslizou para o lado, lentamente, até se abrir por completo. Olhando para a abertura onde estivéramos havia poucos instantes antes e onde Andreia e Helena haviam morrido… porém, quando olhámos para o túnel, vimos que as duas estavam em pé, vivas e a mexer! Saíram do túnel, com um enorme ar de confusão no rosto, a mesma confusão que se deveria reflectir na minha cara e na de Paulo. Abraçamo-nos todos, deixando as lágrimas correrem livremente, e foi Helena a proferir a pergunta que, naquele momento, ocupava a cabeça de todos:

- O que raio se passou aqui?

Só que ninguém, nenhum de nós, podia responder, uma vez que todos sabíamos o mesmo, ou seja nada. Acabámos por nos ir embora dali, tentando encontrar o caminho de volta para casa… e de maneira que ninguém nos visse nus.

 

Ao ver os quatro irem-se embora, sorri, satisfeita. O meu plano funcionara perfeitamente: Belinha e Paulo haviam voltado a reencontrar-se e a unir-se, vendo-os caminhar de mão dada um com o outro. Desliguei a energia daquele espaço, pertença de um amigo que se dedicava a explorar “escape rooms” e saí da sala de controlo, para me encontrar com Ana: ainda tinha de ver com que feridas e marcas havia ela ficado no corpo e procurar reproduzi-los em mim mesma, para que Belinha não desconfiasse de nada…

 

Nos dias seguintes, Belinha esteve de folga e disse-me para tirar uns dias para ambas recuperarmos daquela aventura. Depois dessa pausa, voltámos as duas ao trabalho no atelier de cabeleireiros que Belinha tinha no RioSul. Vi-a ainda com alguns pensos e nódoas negras, mas nunca falou com ninguém a respeito do que lhe acontecera, dando respostas evasivas aos mais curiosos. Só comigo, que também havia “passado” pelo mesmo, é que se abriu mais.

- Já conseguiste perceber o que raio se passou naquela noite? – perguntou-me ela, em voz baixa, quando lhe comecei a arranjar as unhas e a devolvê-las à sua habitual irreverência.

- Estou na mesma… depois de nós… coiso, fui à casa de banho, tocaram à porta e depois… é tudo uma branca até dar por mim presa naquela prisão.

- E como raio é que vocês sobreviveram?

- Sei lá eu! Quando a porta se fechou, ficámos à espera, eu e Helena, do choque eléctrico que nos matasse as duas, abraçadas e unidas à espera do pior, mas nunca chegou a ocorrer nada… depois a porta abriu-se e nós ficámos a olhar para vocês feitas parvas. Qual a cor que queres? – perguntei  mostrando-lhe os vernizes que tinha ali ao pé.

- Hmm… Rosa com brilhantes pretos. – depois, uma pausa – Sabes… quando tudo começou, ainda pensei que isto tudo fosse ideia tua.

- Minha?! – senti-me gelar – Porquê?!

- Oh… tu sabes… tu também és assim meio maluca em arranjar coisas ligadas a sexo… mas depois vi-te a meu lado e percebi que a coisa era a sério.

“Uff!”

- Pois… desculpa, mas acho que não tenho imaginação para tanto.

- Eu sei lá… já vi tanta coisa tua que às vezes até tenho dúvidas. – e Belinha soltou uma gargalhada, enquanto eu procurava esconder o meu desconforto enquanto lhe tirava as unhas de gel antigas.

- Então e… tu e o Paulo? – perguntei de chofre.

- Olha, sabes? Acho que vou dar-lhe uma oportunidade de começarmos novamente. Quem se arriscou como ele para me salvar… principalmente quando eu já tinha desistido dele…  acho que merece, sabes?

- Claro que sei! Raios, tu e ele são a Barbie e o Ken! Só têm é de estar juntos e de fazer inveja a nós, comuns mortais, por ficarem tão bem juntos! Nem nos tempos em que eu estava com o Carlos fazia um par tão perfeito como tu e o Paulo. Vocês foram feitos para ficar juntos e o resto que se foda.

- Mas não foste tu que até me aconselhaste a…

- Shhhhh, passado é passado. E ele mostrou que te merece. O resto que se foda. – repeti.

Ela encarou-me, depois assentou e reclinou-se na cadeira, enquanto eu suspirava de alívio.

Tudo aquilo tinha valido a pena. A “Barbie e o Ken” eram um casal novamente.




1- ver “Orgia de despedida”

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